Depois de anos revisando monografias, teses de doutorado, dissertação de mestrado, artigos científicos e livros, quando me perguntam quais os erros encontrados com mais frequência nesses textos, tenho dificuldade de responder.
Na verdade, a gama de erros é variada. Em termos de quantidade, sem dúvida, levam o “prêmio” a pontuação e a acentuação. Mas estes são, geralmente, erros menos relevantes, muitas vezes resultantes de distração ou de problemas de digitação. Dentre os deslizes mais graves, são comuns as falhas de concordância nominal e verbal. A impropriedade vocabular não é evento dos mais numerosos, mas aparece sempre – todo texto tem um ou outro vocábulo empregado impropriamente. Por fim, há os erros na estrutura da frase, que muitas vezes acabam por gerar sentenças ininteligíveis.
Nos textos técnicos que exigem conhecimento específico distante do repertório do revisor, obviamente, a revisão é focada especificamente no aspecto formal – entretanto, uma frase mal estruturada, ainda que trate de tema que fuja ao domínio do revisor, não passará despercebida. Nesse caso, o revisor apontará o problema e solicitará ao autor que deixe claro o sentido da frase.
Deve-se ressaltar que cada texto tem seu público e sua intenção. O revisor precisa levar isso em conta na “calibragem” do seu trabalho. Afinal, o texto é uma peça de comunicação, e sua eficácia como tal está ligada ao público-alvo e ao objetivo comunicacional. A língua é viva, e muitas de suas regras não são rigidamente delimitadas. Um maior ou menor rigor formal depende do tipo de texto. Há muitos usos da língua que há pouco poderiam ser qualificados como “erro” e hoje são perfeitamente aceitas.
Nos meus trabalhos, em princípio, tendo a fazer uma revisão mais “purista”, salvo se houver tratativa em contrário com quem encomenda o trabalho. De qualquer modo, convém ter presente que nenhuma revisão é absolutamente “perfeita” – não apenas porque é feita por um ser humano, sujeito, portanto, a erros, mas porque uma visão excessivamente “rigorista” sempre encontrará algo a melhorar. Aliás, isso se aplica tanto à forma quanto ao conteúdo. Lembro-me de uma experiência muito curiosa: eu fazia a revisão dos textos de um escritor que publicava livros especializados sobre temas de religião e sociologia. Cada vez que eu entregava os originais revisados, ele acrescentava algo ao texto, que depois me devolvia para nova revisão – e assim sucessivamente, várias vezes, até que ele decidia não mexer mais no trabalho, vencido pelo cansaço. “Revise e não me devolva mais, passe direito ao editor”, dizia ele.
Conta-se que o célebre escritor francês Edmond Rostand era absolutamente obcecado na busca da perfeição de seus escritos. Ele revia e revia e aperfeiçoava seu texto até o limite do absurdo. Seu fantástico “Cyrano de Bergerac” – texto para teatro encenado incontáveis vezes, filmado por vários diretores e parodiado infinitamente – é um exemplo dessa obsessão: de construção magnífica, tornou-se uma das obras-primas da literatura ocidental (de passagem: está entre meus livros preferidos, bem como o filme, baseado nele, dirigido por Jean-Paul Rappeneau e estrelado por Gerard Depardieu). Não é preciso, evidentemente, essa obsessão. Mas um texto bem escrito, em português correto, é condição necessária para que o escritor consiga portar altivamente seu panache.
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